A dor (uma dor) não tem sepulcro
Nuno:
Está toda a gente zangada contigo porque partiste sem te despedir de ninguém. Está toda a gente triste. Até eu, que não te conhecia bem, nem era teu amigo íntimo, ainda por cima achava piada ao teu jeito desajeitado e distraído.
Tiveste um funeral triste, muita gente triste, muitas lágrimas insustentáveis, muitos nós na garganta. Eras novo, muito novo. Tiveste uma morte violenta, com isso melindraste as pessoas. Tinhas muitos amigos, ou simplesmente conhecidos, e acredito que sejas a única pessoa nesta zona que não coleccionava ódios, acredito que foste a única pessoa (pelo menos do meu conhecimento) a não suscitar inimizades de alguém. Mais ainda, a tua morte juntou na dor muitos ódios cruzados, e a tua campa foi o campo neutro para todos chorarem por ti. E deixaste só uma rapariga bonita, que partilhou contigo quatro anos, que já começou a sofrer um calvário, sem ti. E os teus pais, os teus irmãos, primos... toda a dor junta dessas pessoas, tanta...
Não posso deixar de pensar, se toda a gente ali reunida, se cada um morresse um bocadinho para, em troca, tu voltares à vida, se cada um estivesse disposto a tal... mas não. Já estavas morto e isso conforta as pessoas, porque estão vivas e alguém tem de morrer, estávamos todos confortáveis e não queríamos arriscar um milímetro que fosse, seria uma prova de amor suprema, e nós somos egoístas ao ponto de tornar isso impossível. Creio que nem Cristo voltaria a morrer um bocadinho para te dar a vida. Assim é.
No fundo nem estamos interessados, sabemos que te vamos lembrar até parecer - a tua morte - natural. Levámos o nosso cinismo à comoção. No fundo não queremos fazer nada por ti, mesmo omitindo se podemos ou não, é-nos tão fácil chorar e angustiar. Nada te pode trazer de volta, nada, ninguém, nem o esforço de mil milhões de pessoas. Porque, além de não conseguirmos, não queremos. Já te escrevemos o princípio e o fim. És um mártir silencioso, já és passado. E as lágrimas que tanto nos custam, que estão na medida directa do nosso sofrimento, são elas que vão começar a lavar-te das nossas lembranças, até ser esporádica a recordação; a efeméride do teu nascimento, da tua morte, e pouco mais. Foste e és um dos sacrificados para que nós continuemos atentos à nossa fragilidade, à vida e ao egocentrismo. Quem não pensou: “poderia ter sido eu, ou alguém que muito prezo”, e ficou aliviado ter escapado mais uma vez à implacável lâmina da morte. Espero que estejas feliz desse lado, e que desculpes as idiotices que vês serem feitas neste. Até algum dia.
Está toda a gente zangada contigo porque partiste sem te despedir de ninguém. Está toda a gente triste. Até eu, que não te conhecia bem, nem era teu amigo íntimo, ainda por cima achava piada ao teu jeito desajeitado e distraído.
Tiveste um funeral triste, muita gente triste, muitas lágrimas insustentáveis, muitos nós na garganta. Eras novo, muito novo. Tiveste uma morte violenta, com isso melindraste as pessoas. Tinhas muitos amigos, ou simplesmente conhecidos, e acredito que sejas a única pessoa nesta zona que não coleccionava ódios, acredito que foste a única pessoa (pelo menos do meu conhecimento) a não suscitar inimizades de alguém. Mais ainda, a tua morte juntou na dor muitos ódios cruzados, e a tua campa foi o campo neutro para todos chorarem por ti. E deixaste só uma rapariga bonita, que partilhou contigo quatro anos, que já começou a sofrer um calvário, sem ti. E os teus pais, os teus irmãos, primos... toda a dor junta dessas pessoas, tanta...
Não posso deixar de pensar, se toda a gente ali reunida, se cada um morresse um bocadinho para, em troca, tu voltares à vida, se cada um estivesse disposto a tal... mas não. Já estavas morto e isso conforta as pessoas, porque estão vivas e alguém tem de morrer, estávamos todos confortáveis e não queríamos arriscar um milímetro que fosse, seria uma prova de amor suprema, e nós somos egoístas ao ponto de tornar isso impossível. Creio que nem Cristo voltaria a morrer um bocadinho para te dar a vida. Assim é.
No fundo nem estamos interessados, sabemos que te vamos lembrar até parecer - a tua morte - natural. Levámos o nosso cinismo à comoção. No fundo não queremos fazer nada por ti, mesmo omitindo se podemos ou não, é-nos tão fácil chorar e angustiar. Nada te pode trazer de volta, nada, ninguém, nem o esforço de mil milhões de pessoas. Porque, além de não conseguirmos, não queremos. Já te escrevemos o princípio e o fim. És um mártir silencioso, já és passado. E as lágrimas que tanto nos custam, que estão na medida directa do nosso sofrimento, são elas que vão começar a lavar-te das nossas lembranças, até ser esporádica a recordação; a efeméride do teu nascimento, da tua morte, e pouco mais. Foste e és um dos sacrificados para que nós continuemos atentos à nossa fragilidade, à vida e ao egocentrismo. Quem não pensou: “poderia ter sido eu, ou alguém que muito prezo”, e ficou aliviado ter escapado mais uma vez à implacável lâmina da morte. Espero que estejas feliz desse lado, e que desculpes as idiotices que vês serem feitas neste. Até algum dia.
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